quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Sobre ser gorda e estar grávida...

Quando eu estava com umas 12 semanas de gestação, fiquei bem resfriada e com muita dor de cabeça. Achei que era sinusite e resolvi então ir em um pronto atendimento.
Ao entrar no consultório do médico, um jovem médico, por sinal, ele olha meu prontuário e começa a falar comigo:
- Tu tá grávida?
- Sim.
- Quanto tempo?
- 12 semanas.
- 12 semanas... mas essa barriga tá meio grande pra 12 semanas, né?
E eu, sem jeito e envergonhada respondi:
- Eu nunca fui magra... minha barriga já era grande antes de engravidar...

O atendimento seguiu como de costume: perguntas sem ao menos olhar nos meus olhos, mais perguntas antes mesmo de eu concluir uma resposta, um exame clínico e o dignóstico de placas na garganta (pois ele insistiu que eu deveria estar com dor, mesmo eu afirmando duas vezes que não sentia dor nenhuma) e a prescrição de 7 dias de antibiótico.
Saí de lá e só não joguei a receita no lixo por preguiça de procurar uma lixeira.

Mas não é sobre o mau atendimento que recebi que quero escrever neste post, e sim sobre o tamanho de barriga que as pessoas julgam normal durante a gravidez.

Logo que sái do consultório, fiquei com muita raiva de mim mesma por ter minguado diante da pergunta dele, quase que pedindo desculpas por não ter a barriga da Gisele Builtchen. Como eu queria ter "baixado" a maior das barraqueiras e ter dado uma resposta que deixasse ele contrangido pelo o que falou.
Sério que as pessoas não conseguem fazer a relação de que nem todas as mulheres tinham barriga tanquinho antes de engravidar?

Se tu é magra, provavelmente não vai entender o que vou escrever agora, mas, quando se é gorda, encolher a barriga, pra ela parecer ao menos um pouco menor do que realmente é, é um estado normal. Uma gorda nunca está com a barriga solta, relaxada. Pelo menos não se ela estiver na pesença de outras pessoas.
Pois bem, quando se engravida, é simplesmente impossível encolher a barriga! Tu pode até tentar, mas não vai conseguir. Ou pode até conseguir um pouco, mas provavelente vai se sentir desconfortável e ser obrigada a parar.
Então, por favor, entendam: quando uma gorda engravida, provavelmente a barriga dela vai parecer maior que a considerada "normal" para a idade gestacional.
No início da gestação, logo que se descobre, esta diferença é ainda mais evidente. Porque em um dia tu não sabe que está grávida e está tranquilamente encolhendo tua barriga, como de constume. E no outro, quando o teste dá positivo, tu barriga simplesmente salta pra frente, e tu não tem mais controle sobre ela! Isso pode parecer besteira, ou piada mas é mais ou menos assim que acontece...

Lembro que na minha primeira gestação demorei um pouco a curtir minha barriga, e sempre me sentia constrangida com o tamanho dela. Só quando ela tomou mais forma de "barriga de gestante de verdade" eu comecei a admirá-la.
Desta vez, demorei ainda mais pra chegar na fase da admiração, porque como meus músculos já então mais "elásticos" em função da primeira vez, minha barriga está ainda maior, e com mais aparência de barriga de gorda, ao invés de barriga de grávida.
Inclusive, quando as pessoas falam do tamanho da minha barriga, principalmente quando terminam com a velha frase "Mas então acho que são dois! Hahaha!", eu sempre acabo explicando que eu já era gorda e blá blá blá...
Essa repetição, dia após dia, é bem cansativa.

Sei que a forma como me sinto está diretamente relacionada com o meu complexo por ser gorda. Apesar de não fazer nada para emagrecer, eu sempre tive muita dificuldade em gostar do meu corpo.
Mas independente do meu complexo particular, eu pergunto: as mulheres são obrigadas, até mesmo durante a gestação, a seguirem um padrão de beleza?
Se já não bastassem todos os altos e baixos que rondam a mulher durante a gestação, ela ainda tem que carrregar este fardo? Ela ainda precisa se preocupar em satisfazer o que as pessoas esperam ver no corpo dela?

A palavra de ordem parmanece a mesma de sempre: EMPATIA!
E ao contrário do que muitas pessoas pensam, e do que eu mesma pensava, empatia não é menosprezar o sentimento do outro e incentivá-lo a esquecer, a dar a volta por cima. Empatia é reconhecer que tu não é o outro, que tu não viveu o que o outro viveu, e que por este motivo, pode até imaginar, mas não pode saber exatamente como ele se sente em determinada situação.
Nestas horas, o silêncio e o exercício de se colocar no lugar do outro valem mais que mil conselhos!


Obs.1: tenho certeza que eu já fiz algum comentário deste tipo às gestantes que cruzaram meu caminho... Me desculpem! Eu aprendi e não vou repetir!
Obs.2: não tenho propriedade para falar sobre as gestantes magras, mas imagino que também há as que sofrem com a "síndrome da barriga pequena demais"!
Obs.3: sobre as gordas encolherem a barriga, talvez as gordas que aceitam seus corpos como eles são não façam isto. Falo como gorda "não assumida", se é que isso é possível... :)

terça-feira, 28 de junho de 2016

O segundo filho!

Estou grávida!
De novo!


E agora?


E se eu não der conta?
E se eu enlouquecer?
Será que eu deveria ter esperado um pouco mais?
E se não for uma menina, como todos esperam que seja? Eles vão amá-lo? Eu vou amá-lo?
E se eu amar, mas não amar como eu amo o primeiro?
E se eu amar tanto o segundo a ponto de deixar de amar o primeiro?
E o meu casamento, vai resistir a um segundo filho?
E o parto? Ahhhh o parto... Será que desta vez eu consigo?


Estas são apenas algumas das muitas dúvidas que rondam a cabeça das mulheres durante a segunda gestação. Bom, ao menos a minha...
O problema é que, inevitavelmente, as respostas só virão depois do nascimento do bebê. Porque não importa o que a tua família e amigas dirão, aquele "será?" não vai embora antes disso.


Agora, mistura toda esta confusão a um turbilhão de hormônios à flor da pele. Resultado? Choro, choro e mais choro.
Há todo momento vem questionamentos e auto julgamentos difíceis de serem tratados com a razão. É incontrolável!


E se já não bastasse tudo o que a minha cabeça cria sozinha, ainda tenho que lidar com as pressões externas, que horas vem diretamente, com sentenças enfáticas do que e como tu deve fazer, e horas vem apenas com aquele olhar mudo, mas que tu sente que está carregado de "se fosse eu...".


Eu não saí contando a cada pessoa que cruza comigo que eu estou grávida, nem postei nada explícito no Facebook até agora.
Não engravidei por descuido, e este bebê não é indesejado, mas esta está sendo uma experiência completamente diferente do que foi minha primeira gravidez.


Espero nunca mais esquecer de como foram minhas duas experiências para poder ser mais empática com as gestantes que cruzarem meu caminho.
Não é simples, não é igual, e nem tem que ser.


Tudo o que eu preciso é de paz e tempo para me conectar a este novo serzinho que estou gerando...
É pedir demais?
Não, não é.
Eu mereço.
Toda gestante merece!


Obs.: fico cada vez mais pasma com a verdade da piadinha "Se não postou no Facebook, não aconteceu!" Cara, as pessoas realmente fazem esta relação! A primeira frase que escuto quando alguém fica sabendo que estou grávida é "Mas tu nem posto no Face!" Kkk!

sexta-feira, 10 de junho de 2016

“Tem é que matá esses vagabundo tudo!”


Ser assaltado é horrível!
A sensação de impotência que se instala na gente depois ter uma arma apontada pra sua cabeça é algo inexplicável. Nos deixa no chão. Nos sentimos lixo.
E quando um ato destes acaba em uma fatalidade, um ferimento grave, uma lesão irreversível, uma morte, bom, aí eu nem imagino o tamanho desta dor. Mas é certamente imensamente maior do apenas ser roubado.
Nestes dois casos, o ódio, a revolta, a sede por vingança, às vezes até mesmo na mesma moeda, podem vir muito facilmente.
 
Mas, todas as reflexões que eu tenho feito, todo o conteúdo que eu tenho consumido, e principalmente, o fato de eu ter me tornado mãe, me fazem a cada dia repensar essa nossa facilidade de decretar sentenças.
 
Não consigo mais ver uma reportagem em que homens foram mortos em uma perseguição pela polícia após uma tentativa de assalto, sem pensar no que pode ter acontecido na vida deles pra que chegassem até aquele momento.
Não consigo mais ouvir uma pessoa comentando que um conhecido teve seu celular roubado por um ”vagabundo”, sem pensar no quanto este “vagabundo” estava sendo consumido pelo desejo de mais uma dose de uma droga qualquer.
Não consigo mais ver adolescentes serem presos acusados por tráfico de drogas, sem pensar no desespero das mães daqueles guris, que ao receberem a notícia se condenaram tentando entender onde foi que elas erraram.
 
Essas reflexões se instalaram na minha cabeça a partir do momento que eu comecei a me dar conta de quem são estas pessoas. Quem são estes caras que ao invés de trabalharem honestamente querem ganhar a vida roubando o que é nosso? Quem são estes pivetes alocados nas esquinas vendendo drogas aos nossos jovens? Quem são estes “nóias” enfeiando nossas ruas?

Pois eu sei quem são: são meus irmãos, são meus sobrinhos, são meus primos, são meus afilhados; são meus filhos, são meus vizinhos.
É o povo preto e pobre que está marginalizado, é o povo preto e pobre que está sendo preso, e é o povo preto e pobre que está morrendo.
E isto não sou eu quem digo, são as estatísticas: em média, 66% dos jovens infratores vivem em famílias extremamente pobres, e 60% são negros.
 
No Brasil, desde a suposta libertação do povo preto, mais de 100 anos de abandono e descaso pela sociedade se passaram. Mas para muitos, pouco mudou, pois mesmo após gerações e gerações, permanecem às margens, sem conseguir quebrar o ciclo de pobreza e ignorância.
 
Eu sei que tem um montão de preto e pobre por aí trabalhando honestamente, estudando, se formando. Sim, e que bom, que ótimo! Mas não se engane, esta não é a regra. Não menspreze a força que é necessária para vencer centenas de anos de atraso em um país onde nada foi feito pensando no nosso povo. 

Por isso, e por diversos outros motivos, eu temo ser assaltada e ferida nas ruas, como qualquer outra mulher. Mas como mulher negra, eu tento sempre me lembrar que se algo acontecer, provavelmente será o meu irmão (homem preto), que estará diante de mim, e eu não posso/não quero vê-lo como um inimigo.
 

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Coisa de Guri vs Coisa de Guria


Episódio 1 (parte 1):
Fui na pracinha do condomínio com o meu filho e ele se encantou pelas panelinhas de uma criança que estava brincando lá. Pra alegria dele, a guriazinha estava interessada em outras brincadeiras, por isso não se importou de deixá-lo brincar com as panelinhas dela.
Uma outra guriazinha, acho que com uns 3 anos, se aproximou e começamos um diálogo:
- Não pode!
Eu achei que ela estava defendendo os brinquedos da amiguinha, então falei:
- Ah, tudo bem. Ela emprestou pra ele!
Mas ela insistiu, desta vez explicando o porquê:
- Não pode! É de menina!
E eu, já rindo por dentro com a oportunidade, disse:
- Pode sim, é de menina e de menino!
Ela insistiu mais uma vez, com o mesmo argumento, e eu fui na onda dela:
- Pode sim! É de menino também!
Ela me olhou, olhou meu filho enchendo e esvaziando uma panelinha cor de rosa, e cedeu:
- É, pode né?
- Pode. – eu concluí.
E ela saiu pra continuar sua brincadeira.

Episódio 1 (parte 2):
No outro dia do ocorrido na pracinha, conversando com uma amiga no whats app, falei que eu ia ter que comprar umas panelinhas para o meu filho, porque ele havia se encantado pelas panelinhas de uma guriazinha.
- Panelas? - perguntou ela.
- Sim, de brinquedo.
- Compra balde, tipo de praia.
- Por que não pode ser panela?
- Ah, sei lá, menina... kkk! Cada um, cada um...
- Sorry! Pra mim não existe brinquedo de menino e brinquedo de menina... exato, cada um, cada um...
Ela logo mudou de assunto, então acabei nem argumentando.
Uns dias depois veio a hashtag #meuamigosecreto e eu usei o exemplo dela para uma publicação no Facebook, sem citar seu nome, é claro.
Ela me chamou no whats app e conversamos um pouco sobre o assunto. Expus um pouco da minha opinião, ela expôs um pouco da dela, e ficamos por aí.

Episódio 2:
Fui buscar meu filho na casa da minha mãe e cheguei com um conjunto de vassoura, rodo e pá de brinquedo pra ele. Já fazia um tempo que ele não me deixava varrer a casa sem estar atrás de mim tentando puxar a vassoura.
Minha mãe:
- Ah, que legal! Não tinha outra cor, filha? – o conjunto é rosa com detalhes roxos.
- Por que mãe?
E ela já rindo:
- Ah, não sei... preconceito...
- Nada a ver essa coisa de cor mãe. E não, não tinha outra cor, e eu não ia deixar de comprar por causa disso.
Na verdade não sei se ela encarou só a cor como equivocada, o “legal” dela não me pareceu muito animado...

Notaram que as pessoas envolvidas nestas histórias tem idades completamente diferentes?
A guriazinha da pracinha, uns 3 anos, minha amiga, 32, e minha mãe, 61.
Quase 30 anos de diferença entre cada uma delas, e pensamentos muito parecidos.
Outro detalhe: todas mulheres! Mulheres gente!

Mulheres que, em função deste tipo de conceito, carregam os afazeres domésticos nas costas, enquanto o companheiro assiste futebol.
Mulheres que não descansam no final de semana e na segunda-feira voltam pro trabalho já exaustas, por não terem conseguido descansar em função da grande quantidade de lava-limpa-arruma do sábado e domingo.
Mulheres que pensaram/pensam milhares de vezes em desfazer seus relacionamentos porque seus companheiros simplesmente não colaboram.
Mulheres que, com o passar do tempo, tornam-se mais mães do que amantes de seus companheiros, porque eles insistem em continuar se comportando como adolescentes: meia debaixo da cama, prato no sofá, horas à fio jogando vídeo game enquanto a casa está do avesso...

Acho que eu não me encaixo muito neste tipo de mulher... Louça na pia não me impede de tirar uma sonequinha após o almoço, ou de simplesmente não fazer nada.
O que eu quero dizer é que, se a casa estiver arrumada, que o mérito seja dos dois, do casal. Mas se a casa estiver uma bagunça total, a responsabilidade, ou falta de, é dos dois também.
E não importa se pra ti limpeza e organização são prioridades, ou se são coisas secundárias, apenas seja coerente na educação dos teus filhos, tanto dos guris quanto das gurias.
Se pra ti é muito importante saber cozinhar, faxinar a casa uma vez por semana, e ter cada coisa em seu lugar, vá ensinando isso aos seus filhos, desde pequenos, sem obrigação nenhuma, na base da brincadeira mesmo.
Mas se pra ti,  o importante mesmo é aproveitar a vida vendo um filme, descansando, passeando, e na casa dá-se um jeito quando a vontade vier, permita que seus filhos desfrutem disso com contigo.

Dê pro teu filho exemplos das coisas que tu acredita!
Não adianta se queixar que faz tudo sozinha em casa e botar a guria pra lavar louça enquanto o guri navega na internet!
Não adianta se queixar que o companheiro não “ajuda” com as crianças e não deixar teu filho chegar perto de bonecas!
Não adianta se queixar por se sentir uma empregada  na tua própria casa e arrumar a cama, fazer o Nescau e a torrada do teu filho e entregar pra ele na frente do computador todo santo dia!

Tem um montão de coisas deste tipo enraizadas na nossa educação, na nossa cultura.
Vamos mudar isso? Veja nos teus filhos a oportunidade de fazer diferente!

domingo, 3 de abril de 2016

Cabelo ruim?!

Um acontecimento de umas semanas atrás me fez refletir no quanto nós, negros(as), reproduzimos as falas dos brancos.
Já pararam pra pensar?
Pra mim, o assunto em que isso mais se manifesta, é referente aos nossos cabelos.

Quantas vezes tu já chamou o cabelo de um semelhante de ruim, ou de duro?
Quantas vezes que tu já “classificou” uma pessoa como negra usando o cabelo ruim/duro como argumento?
Quantas vezes tu já pensou/disse que determinada pessoa negra não deveria/poderia usar o cabelo de determinada forma, ou de determinada cor, só pelo fato de ser negra?
Quantas vezes tu já penteou o cabelo de uma criança da tua família proferindo comentários do quanto o cabelo dela é difícil, embaraçado, e os mais variados adjetivos depreciativos?

Me envergonha muito, mas eu já fiz tudo isso incontáveis vezes!

A gente esquece o quanto isso nos magoou quando éramos crianças, e repetimos para nossos filhos(as), sobrinhos(as), primos(as)...
A gente esquece o quanto isso nos magoa ainda hoje, e repetimos para aquela amiga do cabelo tipo 4C (crespo que não forma cachos), mesmo que em tom de "brincadeira"...
E ainda falamos estas coisas convictas de que estamos ajudando o outro, afinal, "a criatura tem ter consciência de que o cabelo dela(e) não é bom!"

E não é desculpa, mas  eu realmente acho que fazemos este tipo de coisa no piloto automático, sem consciência alguma do que estamos falando. Porque enquanto vamos crescendo, tudo ao nosso redor conspira tão forte para nos fazer acreditar que nosso cabelo é ruim, que acabamos tomando isso como verdade.

Mas, depois de 30 anos, eu descobri que o meu cabelo não é ruim!
Melhor que isso, eu descobri que ninguém tem o cabelo ruim! Nem a(o) lisa(o), nem a(o) ondulada(o), nem a(o) cacheada(o), nem a(o) crespa(o), nem a(o) de cabelo black power, nem a(o) de tranças, nem a(o) de dreads, nem a(o) careca!
Ah, e como é libertador descobrir isso!
Como é maravilhoso andar pelas ruas, ver uma variedade infinita de cabelos, e achar todos lindos! Ou não, mas ainda assim, ter consciência de que os teus gostos são teus, e o outro não tem nada a ver com os teus gostos!

Abaixo, deixo um trecho de Milionário do Sonho, de Elisa Lucinda.
Muita verdade em poucas palavras:



"Tendo um cabelo tão bom, cheio de cacho em movimento, cheio de armação, emaranhado, crespura e bom comportamento, grito bem alto, sim! Qual foi o idiota que concluiu que meu cabelo é ruim? Qual foi o otário equivocado que decidiu estar errado o meu cabelo enrolado? Ruim pra quê? Ruim pra quem?

Infeliz do povo que não sabe de onde vem.

Pequeno é o povo que não se ama, o povo que tem na grandeza da mistura o preto, o índio, o branco, a farra das culturas.

Pobre do povo que, sem estrutura, acaba crendo na loucura de ter que ser outro para ser alguém."

terça-feira, 22 de março de 2016

Mãe de um guri negro...

Ser mãe de um guri negro é ter medo.

- Eu temo por saber que ainda bebê, sem nem mesmo entender, ao ter fotos suas mostradas aos conhecidos da mãe, do pai, ou das avós, ele não irá receber um único elogio, porque há pessoas incapazes de enxergar beleza em uma criança negra;


- Temo por saber que na escola, quando ele estiver com seu lindo black pro alto, a professora vai enviar um bilhete pra casa solicitando que o cabelo dele seja cortado, por estar atrapalhando a visão dos colegas, ou porque este tipo de corte/penteado "exótico" não é aceito na escola;


- Temo por saber que quando ele estiver num grupo de colegas brancos, uma guria branca vai se aproximar deles e cumprimentar cada um com um beijinho no rosto, exceto o meu filho, que vai receber apenar um oi à distância;


- Temo por saber que se ele vier a namorar uma guria branca, seus sogros serão contra o namoro e farão de tudo pra que um dos dois desista da relação inter-racial;


- Temo por saber que se ele vier a ter filhos com uma mulher branca, ela vai falar todos os dias durante a gravidez que está rezando para que a criança não saia com o nariz grande e largo dele;


- Temo por saber que se ele vier a ter filhos "clarinhos" com uma mulher branca, meus netos vão crescer tentando ser convencidos pela minha nora de que eles são brancos; ou


- Temo por saber que se ele vier a ter filhos "escurinhos" com uma mulher branca, meus netos serão menosprezados pela família materna por não serem brancos como seus priminhos;


- Temo por saber que quando ele for ao supermercado, será seguido pelo segurança do estabelecimento por cada corredor que ele ingressar;


- Temo por saber que ao passar ao lado de uma madame, ela vai atravessar a rua com pressa segurando sua bolsa com força contra o corpo;


- Temo por saber que ele vai ser inúmeras vezes violentamente abordado pela polícia, e que em uma destas abordagens, ele vai ser preso e reconhecido pelas vítimas como o pivete negro que assaltou mulheres na rua.



É claro que eu não tenho como afirmar que todas estas coisas vão acontecer com meu filho, e é claro que eu torço pra que não ocorram, mas há grandes chances de que a maioria delas aconteça.

Espero ter muita força para conseguir orientar e amparar meu filho em momentos como estes.

Obs.: Tudo o que eu citei acima é baseado em acontecimentos reais, presenciados por mim, relatados por conhecidos, ou divulgados na mídia. (EU NÃO EXAGEREI!)

terça-feira, 15 de março de 2016

Ainda sobre o mês da mulher... E a mulher negra?!

É fato que, de forma geral, as histórias das mulheres são muito semelhantes. E isto só reforça o meu discurso de que precisamos sim nos unir.
Entretanto, eu não posso (não devo, não quero e não vou) esquecer que eu faço parte de um grupo específico de mulheres: as mulheres negras. E estar neste grupo me dá embasamento suficiente para falar por mim e por todas as minhas semelhantes.

Ser uma mulher negra é:

- Desde a infância, não se ver representada na TV, no cinema, nas revistas, nos brinquedos, fazendo com que o conceito de beleza seja construído de forma distorcida;


- Desde a infância, odiar o próprio cabelo e lutar durante anos (ou por uma vida inteira) para se enquadrar em um padrão. E frequentemente sem nem se dar conta disto;


- Ser altamente elogiada ao alisar o cabelo e, em contra partida, ser alvo de olhares espantosos (não no bom sentido do espanto) quando resolve assumir o cabelo natural;


- Na adolescência, e talvez na fase adulta também, ser apaixonada pelo guri negro que só tem olhos para as gurias loiras e ter vergonha dos guris brancos por achar que não está "à altura" deles;


- Ver a relação "carnaval>samba>mulata>corpo exposto>cultura inútil de divertimento" ser ano após ano reprisada;


- Ser hiper sexualizada pelos homens, reforçando frequentemente a ideia de que a mulher negra serve para dar prazer;


- Ouvir pessoas brancas e (PASMEM!) negras também, dizendo que todos os itens citados acima são inverdades, exagero e vitimismo!


Há ainda o agravante de ser uma mulher negra no Rio Grande do Sul, também os privilégios de ser uma mulher "negra clara", e uma infinidade de situações não citadas aqui, mas isto é assunto pra outro post.

O que posso dizer é que uma vida inteira de baixa auto-estima é difícil de ser superada, mas que se reconhecer e se redescobrir através da nossa história é um sentimento impagável, e que uma vez alcançado, ninguém pode nos tirar.

terça-feira, 8 de março de 2016

8 de Março: Dia Internacional da Mulher - Desmistificando (Post Inaugural!)

Oi!
Meu nome é Thais, e este é meu post inaugural!
Decidi hoje (8 de Março de 2016) que queria escrever sobre algumas coisas e compartilhar por aí...
E em função da data, nada mais apropriado do que escrever sobre o tema MULHER.
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O universo feminino é rodeado de mitos tão primitivos que nem parecem verdade, mas são!
Abaixo, cito dois que ainda estão bem vivos por aí.

MITO 1: Mulher Maravilha!

Definitivamente, não somos mulheres maravilhas!
Frequentemente, principalmente no dia de hoje, nós mulheres nos deparamos com mensagens nos enaltecendo e homenageando pela árdua façanha de conciliarmos SOZINHAS: trabalho, estudo, rotina doméstica, cuidados com os filhos e, de quebra, nos mantendo lindas, magras, bem vestidas e maquiadas!
Vamos desmistificar umas coisinhas por aqui?
Primeiro – A descrição citada acima, está muito mais pra personagem de novela da Globo do que pra vida real! Vocês têm noção do quanto esta falsa imagem da mulher que dá conta de tudo (do alto do seu salto 15!) pode ser motivo de frustração para a grande maioria que, em situações estremas, mal consegue dar conta de coisas básicas como escovar os dentes, tomar banho e arrumar os cabelos?
Segundo – Este mito da “mulher heroína” só reforça o pensamento de que não precisamos de apoio, companheirismo, e de compartilhamento das responsabilidades, quando na verdade estamos sedentas por isto! É verdade que são muitos os exemplos das mulheres que “dão um jeito” pra tudo, mas muito provavelmente isto não se dá por desejo, e sim por necessidade! E isto lhes custa sanidade psicológica, bem estar físico, auto estima, entre tantas outras coisas.

MITO 2: Eternas Rivais!

Consciente ou inconscientemente, crescemos acreditando que devemos competir umas às outras. Em tudo, e o tempo todo!
Estamos sempre competindo pela atenção de alguém: dos nossos pais, nossos professores(as), nossos amigos(as), nossos chefes, nossos namorados/maridos... E por motivos igualmente diversos: vaidade, afirmação, aceitação, ascensão profissional...
O que nós esquecemos, ou demoramos um pouco para nos dar conta, é que, de uma forma geral, estamos todas no mesmo barco! A grande maioria de nós compartilha de histórias muito semelhantes: assédios, relacionamentos abusivos, sobrecarga de atividades, desvalorização profissional, etc.
Minha mãe sempre diz que "Homem é raça unida, já as mulheres...".
Já não está mais do que na hora de mudar isso?
A grande palavra aqui (e em TUDO na vida) é EMPATIA!
Sempre que rolar aquela vontade incontrolável de competir ou julgar uma de nós, vamos, por 30 segundos, inverter o jogo, nos colocando no lugar da mulher em questão, nos enxergando naquela posição. É muito provável que nossa ação a seguir mude de direção.

Por hoje é isso!
Que nós mulheres possamos continuar lutando nossas batalhas juntas, unidas! E que os próximos '8 de março' tenham a cada ano mais motivos de comemoração!


Obs.: Não sou e nem tenho a intenção de ser dona da verdade! Muito do que eu escrevi aqui ainda está sendo desconstruído e reconstruído de formas diferentes em mim, aos poucos, como em uma desintoxicação, só que psicológica. Então, relaxa!